Um crime foi registrado no Mato Grosso nesta semana: a adolescente Emilly Azevedo Sena, de 16 anos, grávida de nove meses, foi encontrada morta com o bebê arrancado de seu ventre em Cuiabá. Emilly desapareceu na quarta-feira (12) após sair de sua casa, em Várzea Grande (região metropolitana da capital), dizendo à família que iria buscar doações de roupas para o enxoval do bebê oferecidas por uma mulher que conheceu online
Durante o trajeto, ela chegou a mandar mensagens à mãe informando que estava em um carro de aplicativo, mas depois disso não deu mais notícias.
No dia seguinte, quinta-feira (13), um casal suspeito – Nataly Helen Martins Pereira, de 25 anos, e o marido dela, Christian Albino Cebalho de Arruda, de 28 – apareceu no Hospital e Maternidade Santa Helena, em Cuiabá, tentando registrar um bebê recém-nascido como filho deles, alegando que o parto ocorrera em casa. A situação levantou imediata desconfiança da equipe médica, já que a mulher não apresentava quaisquer sinais de ter dado à luz recentemente. Segundo os profissionais, o bebê estava limpo e Nataly não tinha sangramentos ou sinais de puerpério, nem produzia leite materno, evidências de que ela não passara por um parto. Diante da história inconsistente, a direção do hospital acionou as autoridades.
Investigações e prisões
A Polícia Civil, por meio da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), assumiu a investigação do caso. O casal foi detido em flagrante no hospital e encaminhado à DHPP para prestar depoimento. Na mesma noite, equipes da polícia realizaram buscas na casa de Nataly e Christian, localizada no bairro Jardim Florianópolis, periferia de Cuiabá. No quintal da residência, os agentes encontraram o corpo de Emilly enterrado em uma cova rasa, com parte de uma das pernas exposta para fora da terra.
A perícia criminal constatou sinais evidentes da violência sofrida pela adolescente. Emilly apresentava marcas de enforcamento no pescoço e cortes profundos na região do abdômen, por onde o bebê foi retirado de seu útero. Havia também indícios de que a vítima tentou se defender do ataque – suas mãos foram encontradas amarradas para trás e com os pulsos quebrados, demonstrando o extremo grau de violência empregado. Próximo ao corpo, peritos recolheram uma navalha que possivelmente foi utilizada para cortar o ventre e extrair a criança. Segundo o delegado Caio Fernando Albuquerque, responsável pelo caso, a jovem foi morta por estrangulamento com cabos (fios de internet) e asfixia, tendo até um saco plástico envolto em sua cabeça, o que caracteriza um ato meticulosamente cruel.
Imagens de câmeras de segurança de vizinhos mostraram que Emilly chegou sozinha à rua da casa onde ocorreria a suposta doação, pouco antes do crime. Ela acreditava estar ali apenas para receber roupas para sua bebê, conforme combinado dias antes com Nataly. De acordo com as investigações, a suspeita teria atraído Emilly até a residência sob falso pretexto e, em algum momento após a chegada, imobilizado a adolescente e cometido o assassinato. Em seguida, realizou o parto forçado para roubar a recém-nascida e ocultou o cadáver enterrando-o no quintal.
Depoimentos e confissão da suspeita
Com as evidências reunidas, Nataly Helen Martins Pereira acabou confessando o crime durante interrogatório na DHPP. Em depoimento ao delegado, ela admitiu ter planejado e executado sozinha o assassinato de Emilly para ficar com o bebê, isentando os demais envolvidos de participação direta. A suspeita relatou que vinha conversando com a adolescente havia dias, usando a história de doação de enxoval como isca, e que chegou a enviar um carro de aplicativo pago por ela para buscar Emilly em Várzea Grande. Ao chegar na casa, segundo Nataly, ela atacou a vítima, enforcando-a com um fio até a morte, e em seguida usou a navalha para retirar a criança do ventre já sem vida da jovem mãe. Depois, agindo sozinha – de acordo com sua versão – enterrou o corpo no quintal durante a noite de quarta-feira.
A confissão de Nataly levou a uma reviravolta na condição dos outros suspeitos. Christian Cebalho, marido de Nataly, e outros dois homens que haviam sido detidos inicialmente (identificados como Cícero Júnior e Aledson Júnior, possivelmente parentes do casal) foram interrogados e, em seguida, liberados pela polícia na noite de quinta-feira. A defesa dos três alegou que todos eles – incluindo o marido – foram enganados pela mulher, que simulou uma gestação durante meses sem que soubessem de sua intenção criminosa. De acordo com a advogada Ana Cláudia Matos, Nataly inventou toda a falsa gravidez, chegando a compartilhar nas redes sociais um “diário de gravidez”, com fotos de ultrassom e até chá de revelação, para convencer familiares e amigos de que esperava um bebê. “A autora do crime já assumiu e disse que os outros não têm nada a ver com isso”, destacou a defensora em entrevista, reforçando que Nataly seria a única mentora e executora da ação.
Informações preliminares colhidas pela imprensa local sugerem uma possível motivação desesperadora por parte de Nataly. Amigas da suspeita relataram que ela teria perdido um bebê em agosto de 2024 e, por não poder ter mais filhos, passou a manifestar o desejo de “conseguir” uma criança de qualquer maneira. Mensagens de conversas obtidas pela polícia mostram Nataly buscando mulheres grávidas em grupos de mães na internet e oferecendo ajuda com doações – possivelmente já procurando uma vítima em potencial. Uma conhecida chegou a dizer que Nataly ofereceu R$ 5 mil a quem a ajudasse a encontrar uma grávida disposta a entregar-lhe um bebê, embora muitos achassem que ela “falava brincando”. Esses relatos reforçam a hipótese de premeditação: a suspeita teria planejado minuciosamente o crime, motivada por um desejo obsessivo de ser mãe novamente.
Desdobramentos do caso
Luis Paoli, perito criminal da Politec que analisou a cena, descreveu o caso como “uma das cenas mais cruéis e difíceis de processar” de sua carreira. “Em 12 anos de perícia, foi uma das situações mais difíceis de conter a emoção, ao ver uma menina de 16 anos com o abdômen aberto, mãos presas nas costas, asfixiada”, declarou o perito, visivelmente abalado. O delegado Caio Albuquerque, da DHPP, classificou o episódio como um crime gravíssimo, ressaltando que a rápida ação conjunta da equipe hospitalar e da polícia foi crucial para elucidá-lo. “Foi um crime gravíssimo, rapidamente esclarecido pelo Núcleo de Pessoas Desaparecidas da DHPP, com apoio fundamental da equipe hospitalar, que imediatamente identificou que havia algo errado e acionou a polícia”, afirmou o delegado em coletiva de imprensa, elogiando a cooperação dos médicos na denúncia.
Nas redes sociais, multiplicam-se homenagens à memória de Emilly e mensagens de solidariedade à família da jovem.
Até o momento, Nataly Helen Martins permanece presa preventivamente e deve ser indiciada por diversos crimes. Entre as acusações em apuração estão homicídio triplamente qualificado – por motivo torpe, meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima –, subtração de incapaz (sequestro do recém-nascido), ocultação de cadáver e fraude (tentativa de registrar a criança como filha do casal). A investigação da DHPP prossegue para esclarecer completamente a participação de cada suspeito e quaisquer outras circunstâncias envolvendo o caso.
A recém-nascida recebeu atendimento médico e permanece internada em observação no Hospital Santa Helena. Ela está sob os cuidados da avó materna e seu estado de saúde é estável. Após alta hospitalar, a expectativa é que a criança seja entregue aos familiares de Emilly – possivelmente ao pai biológico do bebê – e receba toda a assistência necessária. O governo do estado e o Conselho Tutelar local acompanham a situação para garantir a proteção da bebê. Enquanto isso, amigos e vizinhos de Emilly prestam solidariedade à família enlutada, organizando campanhas de doação para apoiar o sustento da criança.