Quase um ano depois do rompimento da barragem do Quati, na Bahia, moradores de Coronel João Sá, município mais atingido pela inundação, estão morando nas casas que foram interditadas por causa do risco de desabamento.
Este é o caso do vendedor Glaucus Queiroz, que mora na rua da Barroquinha, um dos locais afetados.
“Quer saber a realidade, não é? A Defesa Civil disse que a minha casa está interditada. Eu estou morando na minha casa”, disse.
A barragem do Quati, que fica no município de Pedro Alexandre, se rompeu no dia 11 de julho do ano passado, entretanto foi a vizinha Coronel João de Sá a cidade mais afetada.
Com o rompimento, muitos moradores tiveram as residências invadidas pelas águas do Rio do Peixe.
O número estimado de pessoas afetadas ultrapassou os 2 mil. Ainda hoje, entre 160 e 180 casas, segunda a prefeitura de Coronel João Sá, precisam ser reconstruídas.
Os imóveis atingidos pela enchente que permaneceram de pé foram classificados em dois grupos: os que corriam risco de desmoronar, em que os moradores não poderiam voltar de jeito nenhum, e os que não corriam esse risco.
Em ambos os casos, segundo Glaucus Queiroz, os moradores retornaram para as residências.
“Todas as pessoas que tiveram suas casas interditadas e a casa não caiu, voltaram para elas”.
Outra moradora de Coronel João Sá, a professora Joelma Alves conta que só não voltaram para as residências os moradores que não conseguiram, já que algumas casas foram completamente destruídas.
“Os moradores só não voltaram para aquelas casas que não têm condição nenhuma. Inclusive, tem um morador que tinha uma oficina na frente e a casa era no fundo, que ficava mais abaixo. A casa foi atingida e ele se mudou para a oficina”, disse.
Joelma relatou que a escola onde ela leciona também foi afetada pela enchente, bem como as residências dos alunos.
“A escola onde eu trabalho foi uma das atingidas, uma creche que fica no fundo da barragem. A maioria dos meus alunos foram atingidos.
“Minha casa não foi atingida, mas a minha garagem foi, encheu de água, ficou alagada. Eu escapei por pouco. Até hoje não posso ver chuva que fico nervosa”.
O único benefício a que os desalojados tiveram acesso foi um aluguel social no valor de R$ 500, pago durante seis meses. Desde fevereiro, eles não receberam mais nada.
Os moradores reclamam da falta de apoio da prefeitura, como relata Glaucus Queiroz.
“Apesar do aluguel social que chegou três meses depois, não chegou nem ao pé do que a gente perdeu. Quem teve condição de ajeitar sua casa da maneira que pôde, ajeitou e está morando nela. Fora isso, praticamente ninguém teve assistência”, disse.
“Ele [o prefeito Carlinhos Sobral] prometeu que teria indenização, mas absolutamente nada foi feito. O prefeito não tem intenção de mexer nisso”.
O prefeito de Coronel João Sá, Carlinhos Sobral, contou ao G1 que o município não tem dinheiro para arcar com a reforma e reconstrução das casas.
De acordo com ele, a prefeitura cedeu um terreno para a criação de um novo bairro, porém o custo para tirá-lo do papel é muito alto.
“Pelo volume de construção, fica um valor muito alto e o município não tem condição, então eu recorri ao Governo do Estado e ao Governo Federal”, afirmou.
“Para entregar um bairro, você tem que entregar uma estrutura com água, energia, calçamento, praça. Tem que entregar um bairro que seja de moradia digna. É altíssimo. São muitas casas. São mais de 150 casas”.
O prefeito confessa que tomou conhecimento de que muitos moradores voltaram para as residências interditadas e diz que, diante da dificuldade financeira que eles enfrentam, “não tem jeito”.
“Muitos pagaram aluguel, muitos estão na casa de parentes e muitos voltaram para suas casas. Mas não tem jeito. A pessoa sem condições, às vezes não têm um parente que aceite ele morar, não tem dinheiro para pagar o aluguel. E a prefeitura não tem condições”, explicou.
Sobral relatou que solicitou ao Governo Federal, através da Defesa Civil, verba para a reforma das casas, pedido que logo foi negado, e para a reconstrução de outras, esse último ainda em análise.
Diante da negativa, o prefeito conta que entrou com ações no âmbito administrativo e judicial contra a União.
“Quando eu recebi a negativa, eu contratei um advogado em Brasília e abri processo contra a União. Entrei com uma liminar pedindo várias coisas: a reconstrução das casas, que pagasse o aluguel social até o dia que construísse a casa – porque, pela Defesa Civil, só pode pagar seis meses”, disse.
Carlinhos Sobral participou da primeira audiência no final do ano passado. Uma segunda foi agendada para março, porém não foi realizada por causa da pandemia do coronavírus.
Sobre o pedido de reconstrução das casas, que ainda está em análise, ele acredita que pode conseguir a verba através de algum ministério, como o das Cidades, por exemplo.
“Na última resposta que recebi semana passada, me pediram para atualizar os dados, e eles já responderam dizendo que a Defesa Civil não tem esse dinheiro para reconstruir”, disse.
“O que eu entendo? O orçamento da Defesa Civil é muito pequeno. Pela Defesa Civil, você não vai conseguir esse recurso. Agora, existem esses ministérios que têm verba e orçamento para isso. Então, não quer dizer que não possa ser feito pelo Ministério das Cidades”, conclui.