Nesta madrugada, Pedro Bial entrevistou o morador de rua Adriano Casado, em seu programa, “Conversa com Bial”, para falar sobre os sem-tetos na cidade de São Paulo, que teve um aumento nesta população de 53% nos últimos quatro anos, ultrapassando os 24 mil, e também da vulnerabilidade diante da pandemia do coronavírus.
Morador de rua há dez anos, Adriano contou sua história e explicou que já teve casa, mulher e dois filhos, sendo que um acabou falecendo há dois anos, antes de viver nas ruas. “Nós não somos o perigo. As pessoas têm medo de nós, mas nós é que estamos em perigo. A gente que tem que ter medo da sociedade“, avaliou.
Hoje, Adriano tem como únicos pertences as lembranças da família estampadas em algumas fotos, um aparelho celular, camisas do São Paulo e livros de literatura e arte, principalmente de Vincent Van Gogh, seu ídolo. “Van Gogh era praticamente um morador de rua; bebia demais, era tachado como louco e tinha um talento incrível“, disse ele.
Falando direto de um Centro Temporário de Acolhimento (CTA), local que abriga moradores de rua, Adriano contou que, com a chegada da covid-19, as pessoas começaram a sentir na pele o mesmo que os sem-tetos passam diariamente em determinadas situações.
“Agora, nós estamos iguais a uma pessoa normal que não pode entrar no mercado ou no restaurante. Antes, quem não podia entrar em um restaurante era só o morador de rua. Hoje em dia tanto faz se é um empresário ou um de nós, nenhum pode entrar em um shopping center”, exemplificou Adriano. “Praticamente, as pessoas estão sentindo o que nós sentimos há muitos anos“, completou.
O padre Júlio Lancellotti, que há mais de 30 anos se dedica a trabalhos sociais para amparar moradores de rua, também participou do programa e reforçou a visão de Adriano sobre os efeitos da pandemia.
“De repente, os moradores de rua descobriram um inimigo invisível que está atingindo a todos. Antes, eles conheciam os inimigos visíveis. Agora, esse inimigo invisível fez com que as pessoas não pudessem mais entrar nos mesmos lugares que eles não podiam entrar. Então, para eles, isso é muito estranho“, disse Lancellotti.
A pandemia também fez com que a solidariedade com os sem-tetos se alastrasse rapidamente, mas, para Lancellotti, essa solidariedade não pode ser passageira.
“Não pode ter um pico e sumir, tem que entrar nas estruturas“, enfatizou o religioso, que complementou: “Não basta só a solidariedade individual, pessoal, ela tem que se tornar estrutural, perpassar a questão política e a questão orçamentária, aquilo que é chamado de política pública“.