Um novo estudo traz à luz a complexidade da cultura chimpanzé, demonstrando como as práticas de uso de ferramentas são transmitidas de geração em geração. A pesquisa utilizou a inovadora “máquina do tempo genética”, que analisa a transferência genética ao longo de milhares de anos para traçar conexões entre fêmeas migrantes e a difusão de técnicas sofisticadas.
Os chimpanzés são conhecidos por sua habilidade em usar ferramentas, que variam desde métodos simples, como pedras, até técnicas mais elaboradas envolvendo folhas e galhos para capturar cupins. Essa cultura, que começou a ser estudada nos anos 90, é caracterizada como cumulativa, onde ideias básicas são aprimoradas e compartilhadas, resultando em comportamentos mais complexos.
A pesquisa, conduzida pelo Human Evolutionary Ecology Group da Universidade de Zurique e publicada na revista Science, também revela que as tradições culturais dos chimpanzés podem se manter mesmo quando os membros do grupo mudam, como visto com os chimpanzés quebra-nozes do Parque Nacional de Taï, na Costa do Marfim. As fêmeas têm um papel vital na transmissão de conhecimento, mas enfrentam desafios ao se integrar em novos grupos sociais.
“Nos chimpanzés, a hierarquia é forte, e fêmeas que chegam novas muitas vezes ficam em posições inferiores, o que pode dificultar a manifestação de novos comportamentos ou levar à adaptação às tradições locais”, afirma Cassandra Gunasekaram, da Universidade de Zurique.
Ao se tornarem adultas, as fêmeas migrantes buscam evitar a endogamia e, ao se juntar a novos grupos, podem adotar práticas culturais que facilitam sua aceitação. Para investigar essa dinâmica, os pesquisadores analisaram a história genética de grupos de chimpanzés, usando a “máquina do tempo genética”, que permite rastrear a evolução e a migração das populações ao longo de milênios.
Essa metodologia ajuda a identificar a relação entre migrações femininas e a transmissão cultural. “Evidências mostram que comportamentos complexos, raramente criados, se difundem principalmente por meio da transmissão cultural, impulsionada pelas migrações femininas ao longo do tempo”, explica Andrew Whiten, professor da Universidade de St Andrews.
A pesquisa também sugere que a habilidade de acumular cultura pode ter raízes no último ancestral comum de humanos e chimpanzés, abrindo novas investigações sobre a evolução cultural em ambas as espécies. A conservação da diversidade cultural dos chimpanzés é tão crucial quanto a preservação da biodiversidade.
Uma iniciativa da ONU visa proteger culturas ameaçadas, como o uso de ferramentas pelos chimpanzés na África Ocidental. “Agora que sabemos que os chimpanzés possuem uma cultura rica, precisamos considerar a preservação dessa diversidade cultural”, conclui Whiten, ressaltando a importância de colaboração entre comunidades locais, povos indígenas e organizações internacionais, como a IUCN.