Psicóloga alerta para perigos dos TikToks sobre transtornos mentais

A psicóloga Clarissa Mendonça analisa a tendência dos TikToks sobre transtornos mentais.

Redes sociais como o TikTok se tornaram um caldeirão de conteúdos diversos, variando desde dicas culinárias rápidas até coreografias de dança cativantes. Entretanto, um tipo de conteúdo que vem ganhando popularidade alarmante é relacionado a transtornos mentais, tornando o diagnóstico e a compreensão dessas condições algo superficial, de acordo com especialistas.

O boom dos TikToks sobre saúde mental

Hashtags como #anxiety (ansiedade em português) e #TDAH acumularam mais de 11 milhões e 9 milhões de visualizações, respectivamente, até o início de 2022. Embora isso possa sugerir uma conscientização maior sobre a saúde mental, a psicóloga Clarissa Mendonça Corradi Webster, professora do curso de Psicobiologia da USP, argumenta que a situação é mais complexa e potencialmente perigosa do que parece.

Webster ressalta que esses vídeos, muitas vezes, simplificam de maneira inadequada questões complexas de saúde mental. “Esta é uma combinação ruim: conteúdos de saúde mental complexos produzidos de forma simples, rápida e sensacionalista na busca de engajamento”, afirma. Um problema específico é a tendência de se “autodiagnosticar” com base em listas de sintomas, algo que Webster argumenta ser uma distorção perigosa da realidade.

Os perigos do autodiagnóstico

Profissionais da saúde, como psicólogos e psiquiatras, passam por anos de formação para poder identificar, diagnosticar e tratar adequadamente transtornos mentais. Um diagnóstico preciso envolve entender o paciente como um todo, algo que não pode ser realizado através de uma lista de sintomas em um vídeo de 60 segundos.

Um estudo de 2022 publicado no PubMed analisou 100 vídeos do TikTok com a hashtag #ADHD (TDAH em português). Descobriu-se que mais da metade (52%) desses vídeos eram enganosos, com 37 deles atribuindo sintomas psiquiátricos comuns ao TDAH de maneira incorreta. Notavelmente, 89% dos produtores desses vídeos não eram profissionais da saúde.

Webster adverte que esses vídeos podem trivializar o diagnóstico e o sofrimento associado aos transtornos mentais. “Cada vez mais, experiências comuns são tratadas no dia a dia com o nome de diagnósticos”, disse ela. Este fenômeno pode levar a uma compreensão errada dos transtornos mentais, possivelmente levando ao estigma e à minimização da luta daqueles que sofrem de tais condições.

Efeito sobre a juventude

Um aspecto especialmente preocupante é o efeito potencial desses vídeos sobre a juventude. Segundo outra pesquisa publicada no PubMed em 2021, 25% dos usuários do TikTok tinham entre 10 e 19 anos, uma idade de formação de identidade crucial. Para esses jovens, vídeos simplistas sobre transtornos mentais podem ter um impacto particularmente danoso.

A conclusão aqui é clara: enquanto a conscientização sobre a saúde mental é crucial, é importante ter cuidado com a forma como essa conscientização é disseminada. Vídeos simplistas e potencialmente enganosos do TikTok não são substitutos para o conselho de profissionais da saúde mental qualificados e apropriados. A compreensão e o tratamento de transtornos mentais requerem um cuidado e uma atenção que vão além da capacidade de um vídeo de 60 segundos.