O tempo, sem sombra de dúvida, segue sendo um aliado de Edson Celulari. Em 60 anos de vida, 40 foram dedicados à arte de contar histórias, com papéis de todo tipo entre cinema, teatro e TV. Agora, ele retoma seu lugar de protagonista em “O tempo não para”, nova trama das sete, no ar dia no 31 de julho, como Dom Sabino, um homem do século 19. Após ser congelado no naufrágio de um navio com outras 12 pessoas, incluindo sua família, o personagem desperta 132 anos depois numa São Paulo caótica e moderna.
— A gente não muda, continua, adquiri coisas, perde outras… Nessa troca, a essência é o que fica. Eu, com 20 anos, já tinha saído da minha cidade no interior, Bauru (SP). Até meus 13, vivi na zona rural, e isso fez toda diferença. A relação com os animais, com a natureza, a plantação… Tenho essa simplicidade até hoje. Obviamente acumulei informações, conquistei espaços que me interessavam… E quero outros, como dirigir cinema, escrever… Tenho muitos projetos. Me perguntaram uma vez quando eu ia parar. Eu? Tenho muita lenha para queimar, quero muitos personagens ainda — ressalta o artista.
O papel principal numa novela exige dedicação e até preparo físico para dar conta do volume de cenas. A rotina pesada não preocupa Celulari, já que os cuidados com a saúde foram redobrados desde o diagnóstico e a cura do câncer, em 2016:
— Quando eu estava no processo de tratamento, Gloria (Perez) me ligou e me convidou para fazer “A força do querer”. Na época, eu disse: “Nesse período vou estar careca ainda”. Ela insistiu: “Quero você careca”. “Mas eu posso estar inchado”, argumentei. “Quero de qualquer jeito”, ela falou. Aquilo foi um grande estímulo. Na verdade, fiz uma participação e, para mim, foi um retorno importante para o estúdio, para ter de novo contato com o ofício que amo tanto. Agora é diferente. Há muitos anos, não vejo um papel tão grande. É ativo, não só em número de texto, mas em ações. Espaço que eu já ocupei. Não que eu tenha que fazer só protagonistas. Existem personagens que não são os principais e são ricos. Nesse caso, ganhei um imenso, de grande responsabilidade na história e que estou assumindo com a maior alegria e agradecimento pela confiança. Para dar conta do ritmo, mantenho atividade aeróbica que eu preciso fazer sempre.
Na trama de Mario Teixeira, dirigida por Leonardo Nogueira, a família de Sabino e seus agregados vão se deparar com uma nova era, de inovações tecnológicas, científicas, comportamentais. E, se em 1886 o fazendeiro poderoso e progressista era dono de escravos, em 2018, despertará no hospital ao lado de Eliseu (Milton Gonçalves), um simples catador de material reciclável, que vai orientá-lo nessa caminhada de descobrimento. E daí nascerá uma bela amizade.
Como na canção homônima de Cazuza, “O tempo não para”, em que poeta diz “eu vejo o futuro repetir o passado, eu vejo um museu de grandes novidades”, Dom Sabino se chocará também com o retrocesso do ser humano.
— A ética dos dois é a mesma como chefe de família. Eles têm os mesmos valores, sabem da importância da palavra… Ao mesmo tempo, Eliseu é um catador, e Dom Sabino acha isso indigno, desumano. Nem no tempo dele permitiria que um escravo fizesse esse tipo de serviço. Puxar carroça era para animal, ele não aceita, mas Eliseu diz que é assim mesmo, faz parte da realidade dele. Dom Sabino tem uma frase que adora dizer: “Bela abolição essa, tô vendo um monte de criança negra passando fome, um homem negro puxando uma carroça”. A novela traz essa discussão contemporânea — adianta Celulari.
Na história, o descongelado é um pai amoroso, mas conservador e ciumento, diferentemente do ator, para a felicidade de Sophia, de 15 anos, sua filha com Claudia Raia:
— Minha preocupação não é com relação ao mundo, é com ela. É saber se está preparada para enfrentá-lo. Sophia está fazendo um curso numa universidade nos Estados Unidos agora. Nos falamos há cada dois, três dias. Até pensei que fosse ser mais ciumento, mas estou me surpreendendo. E Enzo é um homem já. Tem 21 anos e está descobrindo o próprio espaço profissional. Bom menino!