Após ter pai assassinado em Curaçá-BA, mulher se torna advogada e ajuda a condenar acusado do crime mais de 20 anos depois

Uma baiana de Curaçá, no norte do estado, teve o pai assassinado em 1996, quando tinha 14 anos. Em 2012, ela se formou em Direito, virou advogada e, na última terça-feira (27), mais de 20 anos depois, atuou no julgamento que condenou o homem acusado pelo crime.

Após a sentença, que condenou Adão Gonçalves da Silva a 16 anos e quatro meses de prisão em regime fechado, Janicleia de Souza Soares revelou que havia prometido diante do caixão do pai que iria em busca do homem apontado pelo homicídio.

“A promessa que eu fiz no dia da morte dele, no caixão dele, de que a pessoa que cometeu aquele crime iria pagar, iria ser condenado… E ele foi condenado apesar do tempo. Mas a sensação não poderia ser melhor, uma das melhores noites que tive de sono. Botei a cabeça no travesseiro em paz”, disse a advogada, que no júri atuou como assistente de acusação.

Jaime Barbosa Soares foi assassinado com um tiro no rosto. Ele tinha 44 anos. Adão Gonçalves da Silva era funcionário da vítima e suspeitava de um envolvimento de Jaime com a filha dele, uma adolescente, o que teria motivado do crime. Após a morte de Jaime, Adão fugiu e nunca mais foi visto em Curaçá.

Após a condenação, Janicleia revelou sentir uma sensação de paz e dever cumprido.

“Sentimento de paz, sentimento de Justiça, sentimento de satisfação, de visto o homem que matou meu pai condenado. Uma satisfação só dada por Deus mesmo, uma satisfação de consciência tranquila, de honradez”, afirmou.

Janicleia se formou em Direito em 2012. No ano seguinte, ela procurou o Ministério Público da Bahia (MP-BA) para saber sobre o processo criminal envolvendo o pai. Na ocasião, ela descobriu que depois de tantos anos, o prazo para julgamento não tinha vencido, porque o suspeito sequer tinha sido ouvido pela polícia.

“Apesar de tantos mandados de prisão dentro do processo, esses mandados não tinham condições de ir para o banco de dados nacional, porque não tinha nem a qualificação completa dele”, explicou Janicleia.

Diante da situação, a advogada se habilitou como assistente de acusação no MP-BA.

Reprodução TV São Francisco

Ela conta que há 23 anos a saudade acompanha ela e a família. Além de Janicleia, Jaime Barbosa Soares deixou esposa e outros dois filhos.

Com a perda precoce do pai, Janicleia conta que nasceu nela o desejo por justiça e, para não deixar o caso impune, ela decidiu se formar em Direito. A advogada estudou em Belém do São Francisco, em Pernambuco.

Já em 2014, um ano após ela começar a atuar no caso, um mandado de prisão foi expedido. O nome do acusado, que até então estava foragido, foi para o banco nacional de dados para facilitar a localização dele e, em 2017, o suspeito foi preso na cidade de Ipameri, em Goiás. No ano seguinte, ele foi transferido para o presídio de Juazeiro, no norte da Bahia.

Adão ficou à disposição da Justiça entretanto, para a advogada, faltava o capítulo mais importante da história: o julgamento do homem apontado por matar o pai dela.

No julgamento da última terça-feira, o salão do júri ficou lotado. Muita gente acompanhou o desfecho do crime que aconteceu há mais de 20 anos.

Familiares usaram camisas com a foto da vítima e cobraram justiça. Para o comerciante Jairon Souza Soares, filho de Jaime, o sentimento é de orgulho da irmã advogada.

“A sensação de orgulho toma não só a mim, mas toda a minha família. Por ela buscar de forma árdua, de forma serena, sempre a Justiça”, disse Jairon

O promotor de Justiça do Ministério Público da Bahia fez a acusação de homicídio qualificado por motivo fútil, dificultando a defesa da vítima.

“O processo é claro, de forma que o Ministério Público espera uma resposta a esse crime”, disse Rildo Mendes de Carvalho, promotor de Justiça que atuou no caso.

O advogado do acusado alegou que ele teria agido em legítima defesa. “Ele confessou a autoria do crime, entretanto ele disse em que circunstâncias ele praticou o delito”, argumentou o advogado do réu, Henrique Marcula.

Foram mais de 10 horas de julgamento. Quatro testemunhas de acusação e duas de defesa foram ouvidas. Sete pessoas formaram a bancada do júri. Janicleia se manteve firme a todo momento, mas no final do julgamento, emocionada, ela desabafou e pediu justiça.

“Rezem para que nunca sintam a tristeza que carregamos no peito por 22 anos”, disse.

Após a condenação, Adão Gonçalves da Silva seguiu para o presídio Juazeiro.