Quase duas semanas após o Supremo Tribunal Federal fechar a janela que poderia permitir sua reeleição, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), conseguiu atrair para o seu bloco a oposição ao governo, anunciando um grupo mais robusto que o do deputado Arthur Lira (PP-AL), candidato de Jair Bolsonaro (sem partido).
Na semana passada, o grupo político de Maia já reunia seis partidos (PSL, MDB, PSDB, DEM, Cidadania e PV), que somam 159 deputados. Nesta sexta-feira (18), PT, PSB, PDT, PC do B e Rede se uniram ao bloco, que passa a ter mais de 280 deputados.
O movimento representa um revés para Lira, que tentava conquistar terreno na esquerda para se consolidar como candidato do maior bloco.
O PSOL ainda negocia aderir ao grupo. Caso isso aconteça, o bloco de Maia passaria a ter cerca de 290 parlamentares. A sigla mantém a intenção de lançar candidato próprio. Em caso de segundo turno, no entanto, deve apoiar o candidato de Maia contra Lira.
Se conseguir atrair PTB e PROS, que ainda não fecharam as portas para Maia, o atual presidente da Câmara conseguirá a maior parte dos assentos na mesa diretora, o que pode jogar por terra eventuais promessas de cargos na Casa feitas por Lira a partidos aliados, como PL e Republicanos.
O voto é secreto. Por isso, a adesão de partidos a blocos não significa a garantia de votos. São necessários 257 do total de 513 para eleger quem comandará os deputados pelos próximos dois anos.
O anúncio do apoio dos partidos de esquerda foi feito por Maia ao lado dos principais pré-candidatos do bloco: Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Baleia Rossi (MDB-SP).
Apesar de ter aderido, o PT pretende apresentar a Maia um nome que possa disputar a candidatura com os outros dois parlamentares.
Ao apresentar seu grupo, o presidente da Câmara leu carta com críticas ao autoritarismo e em defesa da independência da Casa.
“Porque enquanto alguns buscam corroer e lutam para fechar nossas instituições, nós aqui lutamos para valorizá-las”, leu Maia. “Enquanto uns cultivam o sonho torpe do autoritarismo, nós fazemos a vigília da liberdade. Enquanto uns se encontram nas trevas, nós celebramos a luz.”
No documento, os partidos reconhecem as diferenças entre si. “Porque, diferente daqueles que não suportam viver no marco das leis e das instituições e que não suportam o contraditório, nós nos fortalecemos nas divergências, no respeito, na civilidade e nas regras do jogo democrático.”
Os partidos do bloco de Maia afirmam que a eleição de 1º de fevereiro não é entre candidatos. “Esta é a eleição entre ser livre ou subserviente. Ser fiel à democracia ou ser aliado do autoritarismo. Ser parceiro da ciência ou ser conivente com o negacionismo. Ser fiel aos fatos ou ser devoto de fake news”, indica o documento.
“A Câmara vai escolher se será companheira de um projeto de poder que menospreza as instituições e que por inúmeras vezes sugeriu o fechamento desta Casa, ou se será livre para defender e aprofundar a nossa democracia, preservando nosso compromisso com o desenvolvimento do país.”
Ao final do evento, Maia falou que a definição do nome sai na semana que vem. “A eleição está começando hoje”, afirmou. “Não é uma questão de nome, como eu disse no documento. É uma questão do que nós queremos para o país, e tenho certeza de que esses partidos estarão nisso.”
O bloco de Maia, porém, nasceu com dissidências. A ala do PSL mais ligada a Bolsonaro, por exemplo, deve votar em Lira.
Também há divergências dentro da própria esquerda. Uma parte da bancada do PSB defende voto no deputado do PP.
No anúncio, a presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), afirmou que, apesar de aderir ao bloco, o partido tentará construir apoio para que o candidato do bloco seja das siglas de esquerda.
“A decisão do PT hoje é de integrar ao bloco sem deixar de discutir uma opção, uma alternativa à presidência da Casa“, frisou. “Nós temos muitas diferenças. Já travamos muitos embates nesta Casa, principalmente na agenda econômica. Mas tem uma pauta que nos une: a defesa da democracia no Brasil, das instituições e da liberdade desta Casa”, disse Gleisi.
Presidente do PSL, o deputado Luciano Bivar (PE) ressaltou a importância da democracia. “Nós somos contra o radicalismo.”
Bolsonaro se elegeu à Presidência da República quando estava no PSL, mas deixou a legenda em novembro de 2019 para tentar fundar a Aliança pelo Brasil. Com as dificuldades para a criação do novo partido, Bolsonaro já sinalizou que pode se filiar à outra sigla em 2021, incluindo o próprio PSL.
Após o anúncio de Maia nesta sexta, Lira foi a uma rede social e afirmou ser candidato para “dar voz aos deputados”.
“Coisa que vem faltando aqui nos últimos anos. Meu projeto é claro e está posto. Mas eu queria saber uma coisa: quem é o candidato do @RodrigoMaia?”, escreveu o líder do centrão.
Na retomada da sessão na Câmara, Lira subiu na tribuna do plenário para rebater críticas feitas pouco antes pela deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) e pelo líder do PSB na Câmara, Alessandro Molon (RJ).
“Essa Casa nunca será de ninguém, por parte de ninguém, puxadinho de canto nenhum. Sou da base do governo, deputada Melchionna. Nunca neguei. Como é o deputado Baleia, como é o deputado Aguinaldo, do meu partido”, afirmou. “Vamos tirar essas cortinas, essa desfaçatez.”
Lira avaliou como “democracia de interesse” o apoio das siglas de esquerda ao bloco de Maia. “Sabe lá que interesses moveram para que houvesse essa composição democrática.”
O deputado do PP criticou ainda o fato de muitos dos partidos da aliança de Maia não terem se posicionado publicamente em relação à ação julgada pelo STF que barrou o drible na Constituição que poderia abrir caminho para a reeleição do atual presidente.
A campanha de Lira afirma ter votos do PP, PL, PSD, Solidariedade, Avante, PSC, PTB, PROS, Patriota e Republicanos. Esse bloco soma cerca de 200 deputados. Ele ainda consegue apoio em parte do PSL e também de alguns deputados da esquerda, como PSB.