Ex-vereador Daniel Luiz denunciou fraude bilionária no INSS em 2024 e desencadeou operação nacional
O silêncio dos bastidores foi quebrado quando, em março de 2024, um ex-vereador baiano decidiu agir. Daniel Luiz da Silva, de Paulo Afonso, protocolou uma denúncia que expôs um dos maiores esquemas de fraude já registrados no INSS. O que parecia apenas mais uma reclamação sobre descontos indevidos em benefícios de aposentados e pensionistas rapidamente se transformou em um escândalo nacional, com cifras bilionárias e consequências imediatas para a cúpula do órgão federal.
O que Daniel descobriu? Empresas e associações, muitas vezes apresentadas como ONGs, estavam cadastradas no INSS e realizavam descontos automáticos nos contracheques de milhares de beneficiários, sem qualquer autorização. O dinheiro, segundo as investigações, era repassado para serviços que raramente eram prestados – como planos de saúde, seguros e até descontos em academias. Tudo isso, sem que os aposentados sequer soubessem do que se tratava.
“Diversas ONGs privadas se autodenominam associações que prestam serviços aos aposentados e, sem autorização, obtêm cadastro no INSS e efetuam descontos indevidos em seus holerites”, relatou Daniel Luiz da Silva ao Ministério Público Federal.
A denúncia foi entregue ao Ministério Público Federal em Feira de Santana. A partir daí, o caso ganhou proporções inesperadas. O esquema, apelidado de “Golpe dos Aposentados”, teria movimentado mais de R$ 2 bilhões apenas entre 2023 e 2024. Mas o rombo pode ser ainda maior: estimativas apontam desvios de até R$ 8 bilhões desde 2016, com 97% dos entrevistados em uma amostra afirmando nunca ter autorizado os descontos.
A Polícia Federal, em conjunto com a Controladoria-Geral da União (CGU), deflagrou uma megaoperação em abril de 2025. Foram 211 mandados de busca e apreensão, seis prisões temporárias e o afastamento de seis servidores do INSS, incluindo o então presidente Alessandro Stefanutto. O diretor de Benefícios do órgão, André Fidelis, também foi exonerado após a denúncia ganhar repercussão nacional.
Entre as entidades investigadas, aparecem nomes conhecidos do setor de aposentados, como:
- Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos (Ambec)
- Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi/FS)
- Associação dos Aposentados e Pensionistas do Brasil (AAPB)
- Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag)
- Associação de Proteção e Defesa dos Direitos dos Aposentados e Pensionistas (Adpap Prev)
O esquema funcionava de forma simples e eficiente: as associações firmavam acordos com o INSS para realizar descontos mensais, mas, em 72% dos casos analisados, não apresentavam a documentação exigida. Em muitos casos, assinaturas eram falsificadas para simular a autorização dos beneficiários.
“O que apuramos é que a maioria dessas pessoas não tinha autorizado esses descontos, que eram em sua maioria fraudados, em função de falsificação de assinaturas e de uma série de artifícios para simular essa que não era uma vontade real dessas pessoas”, afirmou Vinícius de Carvalho, ministro da CGU.
A operação, batizada de “Sem Desconto”, atingiu 13 estados e o Distrito Federal. Foram apreendidos carros de luxo, joias, dinheiro vivo e obras de arte. Os contratos das entidades com o INSS foram suspensos, e o governo prometeu ressarcir os aposentados e pensionistas prejudicados.
O caso segue em investigação, com novos desdobramentos previstos e a expectativa de que mais envolvidos sejam identificados. A denúncia do ex-vereador baiano, que começou em uma cidade do interior, mudou o rumo da Previdência Social no Brasil e colocou em xeque a fiscalização dos benefícios de milhões de brasileiros.