Governo prepara PEC para mudar ‘regra de ouro’ do gasto público

Para evitar que Michel Temer e futuros presidentes da República sejam acusados de crime de responsabilidade, a equipe econômica trabalha em uma PEC (proposta de emenda à constituição) para suspender a "regra de ouro", que impede a União de emitir dívida em volume superior a investimentos e custeio.

A proposta foi discutida na manhã desta quinta-feira (4) em reunião entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o ministro Henrique Meirelles (Fazenda), ambos cotados para serem candidatos à presidência, além de Dyogo Oliveira (Planejamento) e Alexandre Baldy (Cidades).

O objetivo da regra é evitar que o Estado se endivide demais para pagar despesas correntes, como gasto com pessoal e conta de luz, empurrando a conta para outros governos.

A PEC, que será relatada pelo deputado Pedro Paulo (MDB-RJ), permite que a regra seja descumprida sem que isso seja considerado crime de responsabilidade (tipo de crime que pode dar margem inclusive para abertura de processo de impeachment de um presidente).

Segundo apuração, essa punição será substituída pela proibição da criação de novas despesas obrigatórias, como contratações ou reajustes salariais —os mesmos mecanismos corretivos que entram em vigor se o teto de gastos for descumprido. Essas sanções também valerão para Estados e municípios que descumprirem as regras.

O texto ainda está sendo estruturado em parceria com técnicos da Câmara, do Ministério do Planejamento e do Ministério da Fazenda —não está claro se as novas regras valeriam também em 2018 ou somente a partir de 2019.

"A solução por mudar a regra do jogo reforça quão enroscado o governo está no quesito fiscal", afirma o economista Fabio Klein, da consultoria Tendências. "A regra de ouro passou a se tornar um problema à medida que o déficit foi se ampliando e gerando nova dívida. Como a fonte do déficit decorre muito do crescimento de gastos correntes obrigatórios, forçando o corte nos investimentos, então de certa forma faz sentido buscar soluções que ataquem a fonte do problema: o crescimento dos gastos obrigatórios", completa.

Ele ressaltou, entretanto, que mudanças de regras no meio do jogo sempre parecem "problemáticas". "O problema aqui é que, enquanto não se resolve a fonte do problema, não se cura o paciente, por mais que se tente recuperá-lo", declarou, se referindo à necessidade de aprovação da reforma da Previdência e reversão de desonerações tributárias.

BNDES

O risco de descumprimento da regra de ouro aumentou com o agravamento da situação fiscal. De um lado, o governo tem emitido mais títulos para financiar despesas. De outro lado, foi obrigado a cortar drasticamente os investimentos públicos, uma das poucas despesas que pode manejar sem mudanças na legislação.

Em 2017, a situação foi resolvida com o retorno de R$ 50 bilhões do BNDES aos cofres do Tesouro. Mas em 2018 esse descompasso alcançará os R$ 184 bilhões, de acordo com o Tesouro.

Sem uma devolução mais substancial de recursos do banco no ano que vem -o pedido é por R$ 130 bilhões adicionais, o que ainda está em negociação- não há solução para o problema.

No início deste mês, o diretor do BNDES, Carlos Thadeu de Freitas, afirmou ) que se tiver que repassar recursos ao PIS/Pasep e ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), o banco não terá como devolver ao governo federal os R$ 130 bilhões aguardados em 2018.

Segundo ele, o BNDES tem a repassar esse ano cerca de R$ 70 bilhões ao FAT e ao PIS/Pasep. "A devolução ao FAT é uma decisão institucional e, no caso do PIS/Pasep, depende do volume de saques que até agora está baixo", disse.